quinta-feira, 16 de abril de 2009
UM SUPERMERCADO NA CALIFÓRNIA
Allen Ginsberg
Como estive pensando em você esta noite, Walt Whitman, enquanto caminhava pelas ruas sob as árvores, com dor de cabeça, autoconsciente, olhando a lua cheia.
No meu cansaço faminto, fazendo o shopping das imagens, entrei no supermercado das frutas de neon sonhando com tuas enumerações!
Que pêssegos e que penumbras! Famílias inteiras fazendo suas compras à noite! Corredores cheios de maridos! Esposas entre abacates, bebês nos tomates! – e você, Garcia Lorca, o que fazia lá, no meio das melancias?
Eu o vi, Walt Whitman, sem filhos, velho vagabundo solitário, remexendo nas carnes do refrigerador e lançando olhares para os garotos da mercearia.
Ouvi-o fazer perguntas a cada um deles: Quem matou as costeletas de porco? Qual o preço das bananas? Será você meu Anjo?
Caminhei entre as brilhantes pilhas de latarias, seguindo-o e sendo seguido na minha imaginação pelo detetive da loja.
Perambulamos juntos pelos amplos corredores com nosso passo solitário, provando alcachofras, pegando cada um dos petiscos gelados e nunca passando pelo caixa.
Aonde vamos, Walt Whitman? As portas fecharão em uma hora. Para quais caminhos aponta tua barba esta noite?
(Toco em teu livro e sonho com nossa odisséia no supermercado e sinto-me absurdo.)
Caminharemos a noite toda por solitárias ruas? As árvores somam sombras às sombras, luzes apagam-se nas casas, ficaremos ambos sós.
Vaguearemos sonhando com a América perdida do amor, passando pelos automóveis azuis nas vias expressas, voltando para nosso silencioso chalé?
Ah, pai querido, barba grisalha, velho e solitário professor de coragem, qual América era a tua quando Caronte parou de impelir sua balsa e tu desceste na margem nevoenta, olhando a barca desaparecer nas negras águas do Letes?
in UIVO, 1956
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Um comentário:
Que bom lembrar desses malucos iluminados. Parabéns pelo blog.
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