sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
2010
PAROANO/ Weydson Barros Leal
Que este ano seja feito de segundos, vividos um a um,
e não apenas de meses, semanas ou dias riscados no calendário;
que os dias não sejam só expedientes de onde queremos fugir,
pois não se pode fugir do tempo.
Que não sejam somente números as vinte e quatro horas de cada dia,
nem sua passagem a espera pelo sábado ou o domingo
que apenas renovam esta verdade:
a natureza não sabe os nomes do tempo.
Que o ano seja feito de dúvidas e certezas – essas tantas
metades da esperança –, pois a certeza sabe que a fé pode ser maior
do que aquilo que está para acontecer, e a fé transforma os homens,
que transformam as coisas e os dias.
Que o ano seja sempre melhor do que poderia ter sido
nos nossos desejos passados,
e que os votos para o ano novo
nos últimos dias de dezembro, se transformem em verdade,
e que não esqueçamos das pessoas a quem desejamos,
naqueles dias, não sabemos mais o quê.
Que o ano que começa seja para “fazer o mundo feliz” –
seja lá o que isso for –,
mas também para mudar as certezas, realizar novos planos,
e para que esses planos e essas certezas sejam maneiras
de melhorar a vida, pois é a vida –
seja lá o que isso for – o sentido de tudo.
wbl
quarta-feira, 11 de novembro de 2009
Beduíno: "Ei, espera aí, aonde você vai?"
Camelo: "Já chegamos! Você já está bem! Não precisa mais de mim!"
Beduíno: "Mas só porque eu estou bem você não precisa me deixar sozinho aqui! Ei, cuidado com os carros!"
Camelo: "Vou voltar para o deserto. Você agora está em casa. Quando precisar, sabe onde me encontrar..."
Beduíno: "Espera aí, quero te dizer uma coisa!"
Camelo: "Fala logo. Essas ruas me deixam louco. E ainda por cima me olham como se eu fosse um ET!"
Beduíno: "Quero te dizer que você me ajudou muito. Vou sentir sua falta."
Camelo: "Você vai me esquecer quando estiver completamente bem. Não vai mais lembrar de mim, pelo menos enquanto se sentir seguro. Depois, se precisar, já sabe, estarei na minha duna te esperando. Venha quando quiser. Pode ser só para uma visitinha."
Beduíno: "Quero te agradecer muito."
Camelo: "Tá bom. Agora deixa de choradeira e vai logo pegar o teu livro."
Beduíno: "Obrigado de coração."
Camelo: "Deixa disso bobão, e quando vier me visitar, traz uma lembrancinha."
wbl
domingo, 8 de novembro de 2009
quinta-feira, 5 de novembro de 2009
quarta-feira, 4 de novembro de 2009
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
terça-feira, 20 de outubro de 2009
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
domingo, 18 de outubro de 2009
Beduíno: "O que é isso de novo?"
Camelo: "Um presente."
Beduíno: "Você já me deu um desses!"
Camelo: "Você vai aprender."
Beduíno: "Eu não preciso disso, eu preciso ficar bom, não aguento mais!"
Camelo: "Você não sabe o que é."
Beduíno: "Claro que sei, deve ser estresse ou, senão, algo mortal."
Camelo: "Isso às vezes me deprime."
Beduíno: "O quê?"
Camelo: "Você não sabe a diferença entre um camelo e um dromedário."
wbl
sábado, 17 de outubro de 2009
sexta-feira, 16 de outubro de 2009
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
Camelo: "E então?"
Beduíno: "Creio que há uma melhora."
Camelo: "Você precisa ser mais positivo".
Beduíno: "Não é fácil quando estamos doentes."
Camelo: "Eu não fico doente nunca."
Beduíno: "Como consegue isso?"
Camelo: "Vivo cada dia".
Beduíno: "Mas eu também."
Camelo: "Você tem esse maldito calendário."
Beduíno: "Vou rasgar o calendário."
Camelo: "Uhuuuuuuuuu!"
wbl
quarta-feira, 14 de outubro de 2009
Camelo: "Estou bem?"
Beduíno: "O que é isso?"
Camelo: "Esse deserto é muito sem graça."
Beduíno: "Será que não está meio ridículo?"
Camelo: "Eu acho bacana."
Beduíno: "Se aparece alguém no caminho, pode ficar chato."
Camelo: "Você devia se alegrar."
Beduíno: "Até quando você vai usar isso?"
Camelo: "Capricha na foto!"
wbl
terça-feira, 13 de outubro de 2009
Camelo: "Onde você andou?"
Beduíno: "Fui ao médico."
Camelo: "Você e seu fatalismo..."
Beduíno: "Há algo errado comigo..."
Camelo: "Isso eu sempre soube, e quem lhe conhece também..."
Beduíno: "Você e seu positivismo bem humorado. De qualquer maneira..."
Camelo: "O que você tem?"
Beduíno: "Acho que estou morrendo..."
Camelo: "Todos estamos. Assim como renascemos mais ou menos..."
Beduíno: "Acho que comecei a renascer menos e a morrer mais..."
Camelo: "Você é um romântico fatalista. É ridículo como os homens vão ficando assim com a idade..."
Beduíno: "Sinceramente, dessa vez eu não sei. Há algo diferente..."
Camelo: "São seus excessos..."
Beduíno: "Excessos de quê?"
Camelo: "Talvez, lembranças..."
wbl
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
Beduíno: "O que é dessa vez?"
Camelo: "Você anda muito calado."
Beduíno: "Estou doente, você sabe..."
Camelo: "Ah, pare com isso, pense no que te faz bem."
Beduíno: "Eu sinto falta..."
Camelo: "Eu também."
Beduíno: "Nós dois aqui nesse deserto, sinto falta do meu espelho."
Camelo: "Isso prova que existe."
Beduíno: "O que? O espelho?"
Camelo: "O que você vê no espelho."
Beduíno: "Mas não está aqui."
Camelo: "Então é maior ainda."
wbl
domingo, 11 de outubro de 2009
Beduíno: "Ei, o que você está fazendo?"
Camelo: "Não está vendo?"
Beduíno: "Eu estou doente e você fica aí?"
Camelo: "Ora, você está doente, não eu! Além disso, isso faz bem..."
Beduíno: "Você nâo respeita um doente?"
Camelo: "Relaxa!"
Beduíno: "Eu estou doente, não posso!"
Camelo: "Pode sim! Olha a paisagem..."
wbl
sábado, 10 de outubro de 2009
Camelo: "Você parece preocupado."
Beduíno: "Não me sinto bem..."
Camelo: "Um dia iria acontecer..."
Beduíno: "É difícil acreditar..."
Camelo: "Ninguém acredita, até o último instante... Olha esse céu, esse mar!"
Beduíno: "Você e suas paisagens..."
Camelo: "Já é alguma coisa..."
Beduíno: "Não me sinto bem."
Camelo: "Procure olhar as coisas como se fosse a primeira vez."
Beduíno: "E se for a última?"
Camelo: "Também é uma primeira vez."
wbl
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
Beduíno: "Você está rindo de quê?"
Camelo: "Você está sempre preocupado."
Beduíno: "Claro! Nós estamos neste sol e você olhando a paisagem!"
Camelo: "Agora estou olhando pra você."
Beduíno: "E daí?"
Camelo: "Um pequeno passo pode mudar tudo."
Beduíno: "Ah, não enche! Eu tô queimando aqui! O que mais você quer?"
Camelo: "Sai da frente!"
wbl
quinta-feira, 8 de outubro de 2009
domingo, 4 de outubro de 2009
- Digamos que fora deste alvo esteja a liberdade, que os círculos do alvo são seus riscos, e que em seu centro exista um segredo, habite uma verdade. Não seria um pecado não preferir a liberdade? Não seria o acerto, em qualquer de seus círculos, o princípio de toda expiação? Errar não será melhor? Por que arriscar esse jogo, se, ao atingi-lo em qualquer ponto, a liberdade correrá perigo? - ele indagou, diante da árvore onde balançava o velho alvo.
- Eu prefiro o risco desse amor - ela respondeu - a não saber que gosto tem o seu desafio. Não acertá-lo é um risco em si mesmo, mas a possibilidade do alvo é sempre uma porta para uma outra pergunta: "Por que não desejar?"...
wbl
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
"Qual seria a razão disso?", ela pergunta. As respostas podem ser muitas. E se multiplicam a cada olhar. Talvez exibam sinais de uma beleza perdida ou de uma liberdade impossível, mas sobre as quais persistirá o diagnóstico de uma convicta solidão. "Será isso uma obsessão?", ela insiste. Não sabemos. Mas aqui respira aquela sensação de quando todos os objetos, lugares e melodias nos remetem, permanentemente, a uma única pessoa.
wbl
quarta-feira, 23 de setembro de 2009
Igitur ou A Loucura de Mallarmé
Weydson Barros Leal
Avignon teria sido feliz se Monsieur Mallarmé riscasse poemas na lousa apagada. Mas a vida precisava dos números - os pratos acesos eram as telas do estômago - e Igitur, poeta, fugira de uma Alemanha cinzenta. Havia trabalhado para um filósofo asmático que morrera de um tipo de solidão generalizada. Igitur poeta escapara da noite por uma ressureição de imagens; resgatara ancestrais nas bengalas dos postes e tornou-se herói de um conto prosopoético. Igitur, disléxico, tinha frase musical e a solidão dos epigramas assonantada e abstrata. Trouxe nos pés uma canção metafísica e no bolso das mãos dados vermelhos pelos quais seria lembrança. Subtraiu de seu livro a sintaxe bem-comportada. Um dia, à porta do poema, disse-lhe sede. O mestre o bebeu como um leite do céu. Engolira a fogueira - não sabia - da poética prática do portão das estrelas. O acaso apaga o dia. O vazio da alma um sapato vazio. Igitur tornou-se hermético como a embalagem do espaço. Inventou Elbehnon - hebraico - filho de Elohim - gangs criadoras de Jeová. Criava tudo. Era poeta. Igitur com Elbehnon foram trama existencial. O vazio era nada - o infinito não se sabe. Ptyx era uma concha grega inventada numa insônia. Igitur insinuou rituais de magia mas não sabia contar. Igitur a loucura do poeta. Elbehnon psicastênico. Igitur o médico e a doidice, o papel e a poesia. Igitur a lógica poética, abstração concreta. O teatro e a peça: Un coupe de dés aboliu as reservas. Em Paris, certa vez, Igitur dava esmolas. O corpo dormia sobre banco de praça. La Bastille, olhos azuis, Rimbaud ainda insone praguejou-lhe a oferta - não compraria o Inferno. Igitur não ouviu. Descia a cavalo o corrimão da noite. O movimento do pêndulo era o soluço dos trens a vapor. Soubera que em Paris ou Avignon o professor conhecia Courbet. “Belicosa, exaltante, preciosa, mundana” sua tinta. Courbet e o professor ouviam miragens. Às nove da manhã, o professor, já poeta, recebeu Paul Valéry para conversa. Era outrubro. Manhã cheia de lua. Valéry conhecia pintura. Sabia Monet, Manet. Escreveu Petit Discours aux Peintres Graveurs. Tomaram chá de ervas até onze e quarenta - o professor tinha cobertos os joelhos. Ouviram falar de Rimbaud. Partiu, parece. Não se sabe muito. Igitur é abstração da Angústia. A Angústia concreta. “Le Rêve a agonisé en cette fiole de verre, pureté, qui renferme la substance du Néant”. A vida de Igitur é um esquema analógico. “Ici: névrose, ennui, (ou Absolu!)”. Igitur não era o relógio - era o pêndulo. Sua raça era a pureza que bebia o absoluto. “O infinito, afinal, está fixo”. Tudo é acaso ou sua reflexão ocasional. O Absoluto. O acaso toca o infinito. O silêncio se olha no espelho. Sombras de seu movimento. Um brinde ao barco bêbado! Os peles-vermelhas e as sereias navegam paralelos. Há semelhanças nas quilhas. As velas são de sonho. Navegam à proa os amigos. Os poetas atrás. Rimbaud baba na popa, seu coração. Monsieur Mallarmé ergue seu brinde de pé. Rimbaud tomou banho no poema. Tingiu de azul o amor fracassado. A aurora explodira como um bando de pombas. Solitude, recife, estrela. Viu Flóridas perdidas com olhos de jaguar. O barco era perdido mas a proa brindava o mar. O charco dessa Europa sabe o branco em sua vela. Monsieur Mallarmé não queria sucesso. Criava cardumes no aquário da noite. A mania dos números ensinou-lhe a operar solidões. Fundou outra literatura. Música e concentração. Gritava numa procissão de cânticos. NADA é palavra de poemas - RIEN. Brincava nos túmulos e conhecia o seu Nada. E era outro o Nada da Morte. Um Nada preenchido de Absoluto. Os dados imitavam as horas. Quatro dados imitam o dia. Um lance do acaso os redime do Nada. Todo poema é um estudo antigo. Fala de ancestrais, de sombras. A criança o homem absoluto. A criança ancestral: Monsieur Mallarmé e Rimbaud eram irmãos, ambos estudaram inglês. O equilíbrio dos nomes era a balança musical que Igitur trazia nos lábios. A música da palavra. O acaso era previsto pelos dedos de Igitur. Monsieur Mallarmé medira o acaso e o infinito. Sua meditação era expressão estética. Não a estética “fora de moda”, que dizia Rimbaud, mas a estética absoluta: “Pintar não a coisa, mas o efeito que produz - todas as palavras devem-se eclipsar ante a sensação”. Queria evadir-se por uma janela do tempo que era o teto em sua alma. Evadiu-se em um mergulho interno e salvou do naufrágio o barco da imaginação. Escreveu Herodiade e L’après-midi d’un faune com pena de asa de anjo. Dramático? - inconcluso. Sua sintaxe tinha o peso do céu. A noite desembocava sua agonia na introdução amarela do dia. Todos, afinal, procuram Baudelaire. Baudelaire é um ancestral que vive. Igitur obra inacabada. Igitur fabrica espelhos sem tempo e bebe a lágrima do Nada. Igitur é um advérbio esquecido. Enfim, Monsieur Mallarmé o deixou numa escada enquanto dormia. Queria conceitos sem trama. O Nada. O Absoluto. O Abstrato entre os dedos do intangível. Para isso encontraria metáforas no cotidiano. A sombra derretera-se em Sonho e Silêncio - Idéia e Azar. Assim nasceu Igitur. A mente rompera a bolsa líquida do Nada. Igitur a bebeu e arrotou o Absoluto.
wbl
sexta-feira, 4 de setembro de 2009
Mesmo que o mundo silencie o motor de todas as certezas,
tu estarás em mim.
Não importa a ausência do corpo,
a mudez dos telefones ou as janelas fechadas,
pois tu estás em tudo o que há de belo e puro.
Nas noites de minhas lembranças
és uma casa iluminada.
Se nela deposito o teu nome,
as coisas se acendem, e por isso
já tudo é como o céu das noites limpas de verão.
wbl
quinta-feira, 3 de setembro de 2009
VOO NOTURNO
No pedaço de lua
que a tua pele ilumina,
é seda e perfume o teu relevo de estrelas.
Em tua geografia todos os pássaros se vestiram de branco
para que em tuas dunas eu erguesse a minha bandeira.
São milhares de luas as curvas que te recriam,
e apenas a tua lembrança
já acende a minha alegria.
(A minha fome velava
enquanto tu dormias,
pois no descanso da festa
o teu silêncio também era poesia.)
No pedaço de lua
que a tua pele acende como uma asa de fogo,
eu guardo a volta e o desejo do meu pouso.
wbl
O VALE
o passado é uma cidade
que não cansa de existir.
é a luz que se equilibra
sobre o tempo do horizonte
que persiste em perseguir.
no presente, o dia, a hora,
é a morte a repetir:
este dia é o mesmo dia
em que em dia de outro ano
haveremos de partir.
nesta lida, o que choramos
é o pão a repartir.
se sonhamos ser felizes
acordados neste sonho
só sonhamos existir.
wbl in Os Círculos Imprecisos
O que nos vem
e o que deixamos.
O que nunca encontra.
O que eternamente
é par.
O lar,
a comunhão...
O que nos é pedido
e o que nos leva.
O que damos, o que
precisamos.
O que é busca, o que somente
nos procura,
o que ninguém concede.
O caminho, o laço, a cama,
o que lutamos pelas mãos,
o que desperdiçamos.
O que nos é dado escrever:
o sonho e o acontecimento.
O homem que ama.
Os danos e o benfazejo.
O lucro, a perda, a falta, o jogo, o amor.
A flecha e o conto.
A ficção, os pés, (a solidão).
O relógio,
a morte.
A música e a vela.
O ventre, o vão, a paixão.
O que queremos.
O que quer.
O que vivemos.
O que vive.
O orgasmo. A espera. A água. A esperança.
wbl in Os Ritmos do Fogo.
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
Dentro da noite,
como esta mão
dentro de outra mão,
o tempo canta o seu silêncio.
Não o silêncio da palavra, de garbo
e definição, mas um canto sobre o que, na distância,
se alimenta ao vencê-la,
estro e ruptura de uma multiplicação infinita,
sombra que sustenta o peso da luz.
Nesta mão de abstrato instrumento,
de ritmo claro como o pulso do céu,
ouço o equilíbrio que sobre a vida
constrói o seu impulso - peso e leveza
de todo princípio - barco que conduz
a algum centro
o sentido de tudo.
wbl in Os Ritmos do Fogo
segunda-feira, 31 de agosto de 2009
Se de menina é feita esta mulher,
é na mulher que a chama acesa dorme.
Seu coração é o seu jardim secreto,
mas dentro dele é amor que se descobre.
É delicado encanto o seu mistério,
embora emoldurado na razão,
pois se olhas fundo, vês a partitura
de uma ternura doce de canção.
Esconde-se no sol o seu silêncio,
e sob a lua o seu sorriso dança:
o fogo é melodia em seu incêndio,
toda beleza o seu mistério alcança.
Se na mulher a chama acesa dorme,
do seu amor meu fogo não se cansa.
wbl
quinta-feira, 27 de agosto de 2009
O MAPA
Tanto de ti em mim eu guardo e reconheço,
que nos teus olhos eu relembro o meu espelho.
Hoje penso, ante a selva azul deste oceano,
que os acasos também se fazem de desejos,
e embora não saibamos até quando ou onde
bate o relógio ou chega o plano dessa estrada,
eu chego a pressentir que o meu e o teu caminho
são sonhos de um vinhedo para um raro vinho...
Que o campo desta safra seja a nossa casa,
aberta para sempre, e assim iluminada.
WBL
POEMA PARA UMA MULHER AZUL
Ela é a música e a alegria de um lugar que não se esquece. Seu corpo nasce na noite que a minha fogueira alimenta.
No berço de sua palavra uma partitura é lembrada como um pássaro que se vê. É sua semente a explosão em branco que toca a onda.
Ela é a chuva, a casa, a mulher e a criança. Veste-se em tudo sua alegria que vibra, e em cada corda de sua beleza um mesmo instrumento canta seu júbilo.
Peixes e estrelas desceram da noite para iluminar sua passagem. Para o dia que nasce ela é o peito e a voz que declara a vida. O seu corpo é amor, e assim é toda verdade.
wbl in A MÚSICA DA LUZ
sexta-feira, 21 de agosto de 2009
VÊNUS
À silhueta magra de sua presença
reduz-se a voz, opõe-se a força,
renuncia o silêncio.
O seu silêncio é lúcido
como um pássaro sobre um touro,
e traz, em sua úmida intimidade,
o riso que pede,
o senho que sabe,
a palavra muda.
O seu olhar tem na semente
a certeza do fruto alto,
e ela não sabe ser mais
que a simples natureza,
quando guarda nas mãos
a pressentida sombra,
a elevada e pressentida sombra
da presença de um deus.
wbl, in OS RITMOS DO FOGO
quinta-feira, 20 de agosto de 2009
GEOGRAFIA DA MEMÓRIA
Amo o teu cheiro, o teu jeito,
o beijo do oceano
que derramas em mim.
Amo a palavra
distribuída nas sílabas de tua coluna,
e amo a frase inteira
que o meridiano dos teus quadris circunda.
Amo a ciência dos teus joelhos
e o ângulo agudo dos teus cotovelos;
amo a atmosfera do teu pelo, a lua
no cabelo e a claridade do espelho
em cada uma de tuas unhas.
Amo a estreita circunferência
que a tua cintura enriquece,
e em tuas pernas os caminhos
por onde o teu banho desce.
Amo os teus olhos,
que os meus olhos nunca esquecem,
e os incêndios que a tua língua
ateia em minha pele, despertando cada poro
que se acorda dormente, mas que sente, e sente, e sente...
Amo os teus braços de dulcíssima firmeza
quando os meus braços os cingem,
e eles fingem ser asas
para que me carregues até a mais alta
das encostas, onde outra vez
eu te amo, amando tudo em ti,
o teu gemido,
o teu silêncio,
a tua resposta.
weydson barros leal, in A Quarta Cruz
POÉTICA
Sobre a cama, só, ela escreve na parede do quarto:
"Anarquia que sabe o meu desejo profundo,
eu quero beber o sêmen do mundo,
enquanto o dia for apenas provisório...
Sinto-me eterna como um morto que sonha...
Ele está nu, e dança sobre a sala,
o meu segredo é somente o que se fala,
o púbis me pulsa a úmida fome..."
E com o travesseiro entre as pernas, dorme...
wbl
quarta-feira, 19 de agosto de 2009
O calendário emoldura a janela com sua rede de pêndulos e ponteiros. Na rua o tempo desfila o seu cortejo. Três dias, ou dois dias e meio, para o sábado. Uma névoa é um véu sobre o céu do Rio. O jornal anuncia a chegada do frio para os próximos dias. Mas eu espero um balão, um foguete, um avião, e hei de fazer uma fogueira na sala da minha casa...
wbl
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