sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009


BIRDS

Life
Pretending time
A line
That never ends

Let´s make of ourselves
Just hands
That can be held

Even time
When love is in sight
Loses the distance
Of its own time

(Love like a brilliant
When light is inside)


RESPOSTA

Poema guardado,
coisa de coração.
Presente mais alto
que a iluminada intenção.

Poema de amigo,
que tira verso
do chão, largo
como um começo

de amizade ou paixão.
Que estas, a eternidade
guarda a publicidade
de sua eterna edição.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009




RONDÓ PARA A MENINA DISTANTE
OU REDONDILHAS DE AMOR E CARNAVAL


para Priscila V.

Amor, façamos um trato:
eu te ensino a me esquecer,
tu destróis o meu retrato...

Do contrário, meu amor,
façamos, então, o acerto:
se amares este cantor,

eu recrio o meu concerto.
Isto é só uma poesia,
uns versinhos de sem jeito,

mas, no fundo, se souberes
ler também o que não dizem,
vais saber quanto te querem,

descobrirás o que omitem.
É coisa simples: mas tanto
quanto o brilho dos teus olhos,

é a verdade do que vivem...
São mentiras os meus tratos,
pois gostam mais do que dizem...

domingo, 15 de fevereiro de 2009

CINEMA


Filme: “O Casamento de Rachel”
Título Original: Rachel Getting Married (EUA, 2008)
Direção: Jonathan Demme
Elenco: Anne Hathaway, Rosemarie DeWitt, Bill Irwin, Tunde Adebimpe, Mather Zickel, Anna Deavere Smith, Anisa George e Debra Winger

Tudo o que se disser sobre este filme pode ser verdade. Aliás, sobre quase toda obra que sobreviva no mundo das artes. Com o cinema não é diferente, e como um quadro ou um poema, excetuando-se os clássicos, todo mortal pode gostar ou desgostar de algo. Mas a coisa mais verdadeira que se pode dizer sobre “O casamento de Rachel” é que se trata de um daqueles filmes improváveis a concorrer a um Oscar. Mas está. Anne Hathaway concorre a Melhor Atriz. Se ganhar a estatueta, torna-se mais raro ainda. Isto porque o filme tem – muito ao gosto das raridades da Academia – uma cara de filme independente. Se estivesse, há alguns anos, concorrendo no Sundance Festival, seria barbada. Assim, “O casamento de Rachel”, em alguns momentos, e não sem a proposital intenção do diretor, parece um documentário, ou até uma montagem de trechos caseiros feitos por um cunhado curioso dos bastidores de um casamento. Mas um casamento quase diferente. Este “quase” diferencial não está bem na história, costurada com certa lentidão por um roteiro minucioso e até bem urdido. A estranheza se dá num plano subliminar, acima ou abaixo da percepção comum de quem vai ao cinema só para ver um filme. A questão, por trás de uma trama relativamente comum – o casamento de uma moça cuja irmã problemática ensaia causar problemas –, se evidencia na aparência de festa das Nações Unidas, tamanha a quantidade de etnias e culturas misturadas, sem muita explicação, na salas e jardins da casa da noiva. Por isso também o filme ganhou um apelo globalizado e politicamente correto, começando pelos noivos: uma moça branca do continente e um rapaz negro do Havaí. Neste viés, é interessante ver a condução cuidadosa de Jonathan Demme, diretor do filme, em diálogos sempre harmoniosos e felizes entre as famílias dos noivos. Brancos e negros, numa sociedade americana incomum, adoram-se como amigos de infância, e não falta sequer o irmão do noivo que é soldado americano em férias do Iraque. A história, entretanto, está nas mãos de Kim, personagem de Anne Hathaway, segura e convincente num papel raramente sério – depois de uma princesa da Disney e uma secretária que aprendeu a vestir Prada -, dando à sua personagem a profundidade necessária para salvar uma narrativa insistentemente monótona. Paciente de uma clínica de reabilitação de drogados, ela volta para casa para assistir ao casamento da irmã, e lá se destampam os traumas da juventude que incluem a morte de um irmão pequeno. Há o dilema da culpa, um perdão inconsistente, e uma solução nos termos daquelas histórias em que “o seu rei mandou dizer” que salvaram-se todos. A nota curiosa num filme pouco curioso é a festa do casamento propriamente dita, onde mais uma vez as Nações Unidas são convocadas a emprestar figurantes japoneses, chineses, indianos (com seus instrumentos e músicas exóticas), negros e até, pasmem, sambistas brasileiras devidamente paramentadas com os adereços de uma Escola de Samba. Não há explicação para tantos amigos multirraciais, mas eles estão lá. Depois de muita música e dança, Kim volta para sua clínica e tudo termina bem, ou começa, já que apenas acabou a festa de casamento.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

CINEMA

Filme: "O lutador"
Título original: The Wrestler, 2008, 115 min.
Direção: Darren Aronofsky
Roteiro: Robert D. Siegel
Com: Mickey Rourke, Marisa Tomei, Evan Rachel Wood, Ernest Miller, Todd Barry, Mark Margolis, Wass Stevens, Jodah Friedlander



Randy “The Ram” Robinson e Mickey Rourke: personagem e ator feitos um para o outro. Dito de outra forma podemos afirmar que a história da decadência encontrou sua realização – e não diríamos “dramatização” para não abusar do termo. “O lutador” é um desses filmes para esquecer. Ou para aprendermos que o cinema e a vida devem ser melhores. É a montagem pobre de um roteiro ruim que tenta contar o que o fundo do poço pode ser para um homem, já que para Rourke o lugar sempre foi familiar. A forma física atual do ator é perfeita para tal propósito. Ele próprio, por tudo que representa a sua história pessoal, é a melhor ponte entre a ficção e a vida real que o filme representa. Se o propósito do diretor Darren Aronofsky foi esse, alcançou-o em cheio.Um personagem/ator balbuciando resmungos entre lábios botoxicados numa cara deprimentemente plastificada é o retrato da decadência. Para completar a figura, tem-se músculos, muitos músculos mantidos à base de esteróides anabolizantes e um bronzeado artificial. Tudo isso mostrado com certa verdade no filme. O corte realista do roteiro, com relação aos lutadores de tal categoria, tem momentos de verdade lírica, quando The Ram revela que o seu melhor passatempo é um vídeo-game dos anos 80 – época em que ele viveu o seu apogeu midiático –, mas para o qual não consegue sequer a companhia de um adolescente, aborrecido com a precariedade tecnológica do joguinho do velho. Os primeiros 25 minutos do filme são quase insuportáveis, não fosse a aparição salvadora de Marisa Tomei, que também ressurge das cinzas no corpo – belo corpo, por sinal – de uma dançarina de um bar decadente de striptease. Mas há momentos engraçados no filme, se não considerarmos os simplesmente patéticos. Por exemplo, nas cenas em que Rourke assume o papel de vendedor de frios num mercadinho de subúrbio. No primeiro dia de seu novo trabalho, depois de tentar abandonar as “lutas”, o personagem para por uns segundos detrás da porta que separa o armazém da loja, assim como fizera durante tantos anos antes de entrar nos ringues. Parado ali, ele chega a ouvir os gritos e aplausos de uma multidão consagradora, para então adentrar a loja aonde velhinhas já estão prontas para exigir-lhe 50 gramas de maionese de batatas bem pesados. A historinha por trás da decadência do lutador, que tenta dar ao personagem um traço de humanidade perdida (ou nunca encontrada), é a busca de uma filha esquisita que mora com uma amiga esquisita num lugar esquisito. No fim, nada disso funciona, e como quem não tem como dar um ponto final a uma coisa sem pé nem cabeça, o diretor simplesmente apaga as luzes do palco enquanto o seu lutador mergulha no nosso esquecimento.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

CINEMA


Filme: Foi apenas um sonho
Título Original: Revolutionary Road (EUA, 2008)
Direção: Sam Mendes
Elenco: Leonardo DiCaprio, Kate Winslet, Kathy Bates, Kathryn Hahn, Michael Shannon, Dylan Clark Marshall, Zoe Kazan, Kristen Connolly, Ryan Simpkins

Comecemos pelo título. Poucas adaptações – não podemos, aqui, usar o termo “tradução” – de títulos de filmes estrangeiros serão tão ruins como esta. Afinal, o que Revolutionary Road sugere de informação subliminar para o leitor do livro de Richard Yates, no qual é baseado o filme, perde-se no rebatizado raso quando o sentido de sugestão original é engolido por algum romântico “tradutor”. Dito isto, teríamos aqui o filme mais linear e com menor apelo de bilheteria – não fosse pelo casal titânico Leonardo Di Caprio e Kate Winslet – em cartaz atualmente no Brasil . Mas isto não retiraria da obra o que se pode considerar num bom filme, e não apenas para adultos, mas para adultos inteligentes. Em princípio, a história de um casal jovem e cheio de sonhos numa pequena cidade americana pode parecer um enredo morno, mas quando a construção ou desconstrução de uma tragédia familiar é tão bem contada, o resultado é surpreendente. Neste caso, Di Caprio e Winslet fazem bem o que lhes é pedido que façam bem. E assim vão se superando, em cenas que pedem mais ou menos de seus talentos. No caso do “rapaz do Titanic”, só o preconceito evidente contra um ator há muito tempo maduro justifica o fato de, até hoje, ele não ter recebido um Oscar por qualquer uma de suas atuações, não valendo a pena citar os filmes pelos quais ele mereceria um. Mas este “Foi apenas um sonho” também traz outro grande ator, Michael Shannon, no papel de um matemático falastrão, inquilino em férias de um hospital psiquiátrico. Sua aparição é fundamental e emblemática para o desfecho do filme, quando seu personagem surge como uma espécie de supra-consciência ou inconsciente coletivo que explode diante de todos. Após sua primeira visita ao casal protagonista, ao se darem conta de que concordam com tudo o que o maluco dissera, Frank e April (Di Caprio e Winslet) chegam a se perguntar: “Será que nós somos doidos também?” Essa é talvez uma das grandes perguntas que o filme faz ao espectador: será que a loucura é dizer ou fingir tudo? A partir daí, o filme suscita uma discussão incômoda – o aborto – para sociedades como a americana e a brasileira, onde questões religiosas costumam condenar, antes do aborto, qualquer reivindicação dos direitos da mulher. E esta é a questão central do filme. Não podemos, aqui, deixar de anotar o impecável trabalho de figurinos e cenários sóbrios e elegantes, quase sempre monocromáticos, aonde tudo – roupas, móveis e objetos – atende a uma escala de cores entre cinzas e brancos, pálidos beges e ocres. Essas cores refletem a vida bem-comportada e incomodamente apática contra a qual April (Winslet) se revolta e convence o marido a se rebelar. Numa rua pacata de uma cidade pacata de um país religioso, qualquer novo padrão transforma a vida em tema revolucionário. O espectador homem que for ver o filme ao lado de uma mulher inteligente deve tomar cuidado com comentários apressados ou inconsequentes. Pois se sucumbir à tentação de sugerir para o filme um título “sagaz” como, por exemplo, “O casamento”, irá perceber numa frase que tudo pode ser mais profundo do que aparenta, e o que parecia linear se transforma na montanha-russa para a qual poucos estão verdadeiramente preparados.

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

TEATRO/ resenha




Quatro personagens. Duas atrizes e dois atores que surgem de onde parecem guardar todo sofrimento humano. Quatro vozes que se alimentam sem se tocar, que se justificam sem se consolar, como tragédias que sobrevivessem nas câmaras de um estranho coração. Este coração é uma caixa de madeira. Em seu interior iluminado e revestido de vermelho está o lugar da perda, o espaço da falta e o cemitério de todos os traumas, culpas e arrependimentos que são o desnudamento de uma verdade comum: a dor do outro nos incomoda porque também é nossa dor, mas identificar-se com ela é o que, no fim, nos humaniza.

O espetáculo “O Silêncio dos Amantes”, que encena quatro textos do livro homônimo da escritora gaúcha Lya Luft, é um exemplo de coragem no atual teatro brasileiro. Por duas razões: primeiro, não é uma comédia – gênero quase obrigatório na maioria das montagens recentes que, via de regra, buscam a bilheteria de um público fácil; em segundo lugar, por antítese lógica, é uma peça que emociona pela verdade, que nos provoca pela força que a dor humana deposita em cada um de seus sobreviventes. Estes sobreviventes habitam a cena mas também podem estar sentados ao seu lado, ou adormecidos dentro de você. E de cima da caixa de madeira, todos parecem perguntar: “Você teria a minha coragem? Teria a minha força?”... Também por isso, este espetáculo poderia ser classificado como uma tragédia quase nos moldes gregos, não fosse pela engenhosa arquitetura do diretor Moacyr Góes que, ao costurar dramaturgicamente quatro textos independentes, deu-lhes uma identidade contemporânea que os percorre sem os amarrar, que os assemelha sem se repetir, como se quatro mãos sustentassem os fios de uma mesma queda: a dor humana é esta queda, mas também é sensibilidade e elevação.

No primeiro momento da peça, o filho anão de um pai ditador e de uma mãe submissa expõe-nos cruamente os traumas de sua deficiência. Esses traumas não estão necessariamente no ananismo do personagem, vigoroso e afirmativo em seu sofrimento, mas na fraqueza do pai em não aceitá-lo como tal e culpar a mãe por ter gerado “um bicho”. Na relação do pai com o filho anão se evidencia o abismo que vai muito além do preconceito com sua diferença. Este preconceito, como se percebe aqui, pode cegar quem o sente, impedindo de ver que quem sofre a discriminação é aquele que, verdadeiramente, é o mais forte. Neste caso, o anão interpretado por Leon Góes é um gigante.

Entre uma e outra história portas e luzes nos revelam personagens que aos poucos se transformam em anjos, entre os quais também vive uma bailarina – Giselle Lima –, criada à maneira das figuras do pintor francês Edgar Degas. Essas transições ou interlúdios parecem estudados minuciosamente, pois conduzidos pela música original – que per si consiste numa obra dentro da obra - de Rafael e Leonardo Sperling, contrapõem o sofrimento dos personagens à delicadeza de seus movimentos. Há dor mas há delicadeza em tudo.

A personagem de Giselle Lima é uma esposa atormentada pelo suicídio do marido, do qual ela se sente culpada por não ter percebido os sinais iminentes. O marido, vivo em sua recordação, é recuperado na catarse de uma perda pela qual ela se sente responsável. Uma árvore numa estrada, sempre lembrada pelo marido como metáfora materna, na verdade era o seio aonde ele buscaria o definitivo descanso. A esposa então é lucidez e delírio, sonho e poesia, reconstruindo, ora como mulher, ora como menina, o universo lírico da falta e da ausência. Este é o segundo degrau de uma subida através da qual o diretor nos conduz em seu corajoso propósito de um espetáculo que analisa a poesia possível da dor humana, em que explora os limites de nossa resistência diante do espelho que se quebra. Desacostumadas com isso, é curioso observar como, nas primeiras falas do personagem de Leon Góes, algumas pessoas da platéia ainda chegam a esboçar algum riso diante do sofrimento explícito do menino-anão que se debate no palco. Mas logo o automatismo condicionante de uma impossível comédia se dissolve, e com a chegada da mulher interpretada por Giselle, a certeza de que se está diante de uma investigação dramatúrgica da dor se torna latente, e todo silêncio se veste de sensação e poesia. É este idílio dramático que se converte na metáfora plástica de uma bailarina.

O terceiro fragmento do espetáculo obriga o ator Augusto Garcia a uma incômoda missão: após arrumar algumas dezenas de copos plásticos no piso de madeira, o personagem se equilibra sobre eles para nos revelar o filho de uma mãe alcoólatra. Mais uma vez, o encenador faz da cena a metáfora do que conta, e a angústia do público diante da possibilidade do desequilíbrio aos poucos se torna irrisória ante a impotência de uma mulher que sucumbe ao vício e à morte. É a fragilidade deste equilíbrio o que metaforiza, agora, a impotência do filho. E talvez este seja, para o ator, seu segundo e incômodo desafio.

Finalmente, após este terceiro fragmento do que poderíamos considerar a mais ousada investigação psicológica levada à cena por Moacyr Góes, surge a personagem da jovem e experiente atriz Carla Rosa. Uma mãe atormentada é o enredo de sua história. E aqui vale uma observação sobre a escolha e organização dos textos escolhidos por Góes. Embora escritos como capítulos independentes de um livro de contos, essas histórias de Lya Luft não deixam de insinuar uma relação íntima entre si, não apenas na temática da dor – comum a todas –, mas no que permite especular até onde a mãe do menino-anão não seria a mesma que percorre todas as outras histórias, e assim todos os maridos e todos os filhos sendo os mesmos sob diferentes ângulos. Isso cria possibilidades infinitas de relações intertextuais, em que a familiaridade dos personagens não reside apenas no sofrimento comum. É nesta ponte que a mãe atormentada pela perda do filho, interpretada por Carla Rosa, vem coroar “O Silêncio dos Amantes” com uma força dramática digna dos grandes poemas, quando a performance impecável de uma atriz nos proporciona um final irretocável. Carla empresta a seu texto uma gravidade lírica que, num crescendo de sensações, leva-nos à conclusão de que o amor, ainda que enganando a si mesmo, justifica, no teatro ou fora dele, todas as palavras e todos os silêncios para tornar-se real.



Ficha técnica:

O SILÊNCIO DOS AMANTES
Direção: Moacyr Goes
Com: Carla Rosa / Giselle Lima / Augusto Garcia / Leon Góes
Assistência de Direção: André Chevitarese
Direção Musical: Ary Sperling
Cenografia: Paulo Flacksman
Figurinos: Inês Salgado e Fúlvia Costalonga
Iluminação: Paulo Cesar Medeiros
Direção de Produção: Companhia Escola 2 Bufões
Assessoria de Produção: Lúdico Produções Artísticas