sábado, 22 de janeiro de 2011
LES VIVANTS - Le matin essentiel
W.B. Leal
Na manhã seguinte, a vida já recuperara seu verde, sua pedra, seu espaço de cor. Ela escutara notícias de outros desastres, de outros afastamentos que como tantas mortes já não causavam estranhamento. O tempo, ela ouvira, arrasta os vivos e apaga os mortos. Por isso ela não sabia da tristeza de um vizinho nem da alegria dos antepassados de há duzentos anos: nada lembrava o pássaro ou o cão que mesmo amado perdeu seu rastro no caminho da vida. Ela agora percebia as novas separações como uma morte natural, como um nome ou uma cor que o tempo apaga para a renovação de tudo. Acordara como se na noite anterior uma dança com bandeiras tivesse festejado a recriação do mundo. Ela então era a sua nova vida, e tinha que recomeçar, como um rio recomeça, como um sobrevivente, como o dia. Na rua, uma procissão de carroças aguardava em sua porta, e cheias de caixas e baús as carroças ostentavam o acúmulo de certos panos coloridos que eram confundidos com bandeiras. Havia instrumentos que alegraram outras festas e pergaminhos que contavam, com letras que caíam no esterco, histórias que agora eram quase uma invenção, uma fábula onde ela fora incluída como era costume nas histórias da infância. A vida - ela percebeu - começava outra vez. Os pergaminhos não se perdiam, apenas se apagavam das velhas letras para serem escritos outra vez. Os instrumentos, de dentro dos baús, continuavam sozinhos a ser música. Os cavalos, então, começaram a andar.
WBLog/foto: Ana Claudia Lubitz
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3 comentários:
É lindo,real e poético, emocionante...Me fez borrar o rímel.
a foto encaixou tão bem... coisa linda!!!
Aninha, quando vi essa foto pensei exatamente isso... bj
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