segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011


MALADE POUR UN MOT D’AMOUR
W.B. Leal

Quando ele estava doente ela dizia Queria passar a tarde cuidando de você, e isto era como um bálsamo que lentamente curava enquanto ele ouvia o relógio construindo frases que pareciam repetir Queria passar a tarde cuidando de você, pois queria estar vivo para recomeçar o capítulo que só se escrevia com a presença dela, Os relógios são escritores cegos, dizia, Em seus livros o amor é sempre possível não importa a chuva ou a doença, e voltava a dormir sonhando com partituras e danças para uma única dançarina.

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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011


ORBE AMOROSO
W.B. Leal

Na véspera ela escrevera Estou morrendo de saudade, e ele pensou Temos fome do que não vivemos, sentimos os relógios pararem como se o peso de uma delicada lentidão enchesse o mundo do que é só ausência, sim, ela sabia que a distância era o fio que deseja ser quebrado e caberia aos dois este outro laço, desfecho de um segundo passo, alquimia amorosa que transforma a distância em alimento, a espera em aproximação, Eu conto os minutos como grãos de areia, ele confessou, espelhos de um céu apenas começado ou teto que será o universo quando sua presença for a minha casa, e ela sorria enquanto imaginava escrever Eu quero ser este céu mesmo que exista um milhão de estrelas, e ele então diria Tu és a minha estrela.

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sábado, 19 de fevereiro de 2011


O ARCO-ÍRIS
W.B. Leal

Sobre um dorso outro dorso, Corpo sobre corpo, Coração dionisíaco disparando o seu tambor, Ritmo entre o peito e as suas costas, Músculo aceso de extensão iridescente, Carne e caule feitos de sal e sentimento, Idioma sufocado sob as nuvens das fronhas, Ópera de amores cujos versos são solfejos, Palcos que ondeiam como se dois barcos se tocassem e o cais é esta cama, Tudo um oceano na mais alta das montanhas, Quando o horizonte se ilumina, Quatro mãos se entrelaçam e um gemido deflagra a explosão deste dia.

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domingo, 13 de fevereiro de 2011


SUR LE MOTIF
W.B. Leal


Naquela noite ele sentiu os cheiros que o contato íntimo lhe deixara, O seu corpo tem o perfume das flores, pensou, Cheiro que se guarda além do que é corpo enquanto O seu vestido traz a claridade dos laranjais, A espera sempre fora um rito, Cada segundo é um livro feito de espelhos e epílogos cuja razão também sabe um recomeço, e repetia Gosto do teu cheiro, O cheiro da tua pele molhada pela minha boca, Às vezes ela deitava na ponta dos desfiladeiros como se ouvisse a fragilidade do tempo, e prometia que em Junho, quando o inverno iluminasse o seu relógio, o equador seria a sua cidade, e nas linhas de sua mão ele enxergaria o diário em cujas páginas ela estava presente por três dias, A cidade então se acendia, As cortinas e os lençóis se pintavam em bandeiras, E outra vez era o rito, os espelhos, as flores e os laranjais.

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terça-feira, 8 de fevereiro de 2011


CALENDÁRIO
W.B. Leal

Os olhos O riso O contorno da sombra no abismo do chão As janelas do abraço O endereço da casa que se abriu para a alegria O gesto que dorme em cada palco A coincidência do gosto O sabor para sempre guardado A manhã que nunca é cedo O carnaval interminável A delicadeza do que é dito O que o silêncio grita alto As distâncias que protegem O que é perto mas é falso O amor do que nos cura A tristeza do hiato A pétala que conta As horas Os dias Um passo

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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011


NOTURNO AMOROSO
W.B. Leal

Na minha ilha os dias são contados pelos barcos, dizia a carta, E os mortos reconhecem o inverno quando o vento chega tarde Como está a sua vida? Escreva devagar Conte-me alegrias Esconda uma tristeza A distância é esta árvore que na noite se agiganta E lendo cada linha ela sorria Paisagem no papel Horizonte com fumaça Para depois responder que sua lembrança era um rio permanente Quero que gostes do meu vestido Que saibas como sou feliz quando me olhas de perto mesmo longe Mãos dadas sobre a água Corpos juntos quando é noite Não importa a tua ilha Não importa a minha espera O vento Os barcos As ondas

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sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011


LA FÊTE DU TEMPS
W.B. Leal

Um dia ela escreveu Eu te vejo sempre perto E ainda que o teu longe seja todo meu espólio Eu te guardo como uma chave Como uma carta Como uma coisa roubada... Ele agora sentia a impossibilidade de tocar as suas mãos sob as luvas do silêncio, mas lembrava que o tempo, como um vestido de festa feito de rendas e laços, não se apaga, não se apaga, não se apaga...

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quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011


LES FLEURS DE L’AMOUR
W.B. Leal

O teu nome tem as letras que eu gosto, ele disse, como se fosse um amuleto de consoantes e vogais, um amuleto que lembra o amor como se fosse um canteiro... Então, quando era noite, ela costurava uma flor viva no decote delicado e saía para dançar, pois sabia que ele adorava reconhecê-la de longe, no meio da festa, espalhando o perfume que a flor esquecia para que ele nunca a perdesse de vista.

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